Após um estudo mais aprofundado nos anos 90, os cientistas perceberam que a dopamina está mais intimamente relacionada com a antecipação de uma recompensa do que propriamente com seu recebimento. Ela está relacionada portanto com o desejo de algo e a motivação para buscá-lo.
A dopamina ensina o cérebro a prever as próprias necessidades e tenta alinhar seu comportamento com essas necessidades.
A seguir, confira cinco fatos interessantes sobre a dopamina que os cientistas evidenciaram através de suas pesquisas.
1. A dopamina pode sinalizar recompensas naturais e não naturais
Não há dúvida de que as vias de recompensa dopaminérgicas são críticas para a sobrevivência. O sistema dopaminérgico fornece o impulso do cérebro para que possamos comer, amar e reproduzir, as chamadas “recompensas naturais”. Vale ressaltar aqui que, embora as recompensas envolvam a liberação de dopamina no núcleo accumbens e nos lobos frontais, a dopamina não é o único transmissor relacionado à recompensa.
Com o advento da vida contemporânea, a estrutura social humana foi expandindo em complexidade. Agora, a liberação de dopamina pode ser cada vez mais estimulada pelas chamadas “recompensas não naturais”, como álcool, cocaína, mentanfetamina, heroína, nicotina, maconha e outras substâncias. Ou ainda, por atividades compulsivas, como jogos de azar, alimentação e sexo disfuncionais e comportamentos de risco de maneira geral.
Especificamente sobre as drogas, elas podem desencadear uma liberação particularmente poderosa de dopamina em comparação com os reforçadores primários ou “recompensas naturais”. Embora os reforçadores primários possam aumentar os níveis de dopamina em até 100%, drogas como a cocaína podem aumentar os níveis de dopamina em até dez vezes essa quantidade.
Aumentos consideráveis na liberação de dopamina estão associados a sensações de recompensa particularmente elevadas, ou seja, parece haver uma correspondência direta entre o aumento de dopamina e a intensidade de uma experiência prazerosa. No entanto, deve-se ter em mente que a saturação surge rapidamente no caso dos reforçadores primários, e num dado momento não é mais liberada quantidades adicionais de dopamina. Isso não acontece com as drogas na fase inicial do desenvolvimento da dependência.
2. A dopamina não é inerentemente boa ou ruim
A dopamina é liberada principalmente quando uma recompensa surge como uma surpresa ou quando aparecem estímulos que indicam uma recompensa. Contrariamente à noção de muitos, ela não é, como tal, responsável pelos sentimentos positivos durante o consumo da recompensa. Os sentimentos positivos são essencialmente mediados por outras substâncias, como a serotonina e as endorfinas, através de interações com o sistema endocanabinoide, que influencia a neurotransmissão dopaminérgica e serotoninérgica.
Dito isso, sabemos antes mesmo do conhecimento neurocientífico que o desejo pode ser aprazível e construtivo, como também pode nos ser doloroso, nos destruir.
3. O sistema dopaminérgico, o detetive do cérebro
A dopamina está envolvida com a atribuição de um “valor acrescentado” ou “valor de incentivo” a uma substância, situação ou comportamento. Em outras palavras, sinaliza a relevância de algo ao nosso redor.
Os cientistas puderam perceber, por exemplo, que os sinais contextuais associados a uma recompensa (principalmente as recompensas não naturais) podem substituir o valor da própria recompensa como resultado de um processo de condicionamento. Por aprendizagem, as pistas contextuais são capazes elas mesmas de produzir o desejo, que pode ser avassalador, urgente e irreprimível em situações disfuncionais, como no caso das drogas. Este processo está relacionado a alterações na amígdala, resultando em estados emocionais negativos.
O que fica desse entendimento é o papel escrutinador que o sistema de recompensa e a sinalização de dopamina exercem sobre o meio à nossa volta. Um olhar afiado e saliente à procura de pistas que possam nos ajudar a desvendar o mistério de onde podemos encontrar a pretendida recompensa.
4. Temos relativamente poucos neurônios dopaminérgicos
Segundo pesquisas dos anos 2000, existem aproximadamente apenas 200 mil neurônios dopaminérgicos em cada um dos hemisférios do cérebro humano, e seus axônios se projetam para cerca de 1000 vezes mais neurônios pós-sinápticos no estriado, córtex, amígdala e outras estruturas.
Apesar de relativamente poucos, essas células são capazes de fazer um barulho danado na nossa vida.
5. A dopamina cerebral é uma, a corporal é outra
A dopamina não atravessa a barreira hematoencefálica, portanto sua síntese e funções nas áreas periféricas são independentes das mesmas no cérebro. Apesar de existir em grandes quantidades no organismo, predominantemente em outras formas como a dopamina sulfato (DA-S), ela não interfere significativamente nas funções cerebrais.
O fato é que, mesmo a DA-S sendo capaz de atravessar minimamente a barreira, a dopamina em si continua sendo incapaz de fazê-lo. Em um estudo, as concentrações de DA-S no plasma após injeção subcutânea foram cerca de 1000 vezes maiores do que nas amostras de microdiálise cerebral. Fica claro que apenas uma pequena quantidade de DA-S atravessa a barreira hematoencefálica.
O sistema dopaminérgico encefálico parece funcionar de forma muito específica em relação ao seu papel neurofisiológico, com concentrações controladas. Isso porque variações nos níveis de dopamina podem ter um grande impacto na nossa percepção do ambiente e na forma como agimos sobre ele.
Referências e Leitura Complementar:
- Dresp-Langley, B. (2023). From Reward to Anhedonia-Dopamine Function in the Global Mental Health Context. Biomedicines, 11(9), 2469. ➞ Ler Artigo
- Schultz, W. (2007). Multiple dopamine functions at different time courses. Annu. Rev. Neurosci., 30, 259-288. ➞ Ler Artigo
- Suominen, T., Piepponen, T. P., & Kostiainen, R. (2015). Permeation of dopamine sulfate through the blood-brain barrier. PloS One, 10(7), e0133904. ➞ Ler Artigo
Excelente.
Obrigado Larissa!