As dietas cetogênicas são caracterizadas por uma ingestão muito baixa de carboidratos e alta em gorduras. Tais dietas têm demonstrado eficácia no manejo de diversas desordens neurológicas em adultos. Entre essas desordens, destacam-se a doença de Alzheimer, a epilepsia, a enxaqueca, a esclerose lateral amiotrófica (ELA) e o glioma maligno.
Estudos têm mostrado que a restrição de carboidratos e o aumento do consumo de gorduras podem ter efeitos benéficos no controle de convulsões em pacientes com epilepsia refratária, bem como na melhora da função cognitiva em pacientes com Alzheimer.
Evidências da efetividade em estudos clínicos e pré-clínicos
Alzheimer. A pesquisa de Selter e Turner (2019) explorou o potencial das dietas cetogênicas como terapia complementar na doença de Alzheimer. Eles revisaram evidências de estudos pré-clínicos e clínicos sobre os efeitos das dietas cetogênicas na função cognitiva e neuroproteção em pacientes com Alzheimer. Em conjunto, os dados dos estudos sugeriram que a mudança no metabolismo energético, induzida pela dieta cetogênica, pode ser um mecanismo eficaz para melhorar os sintomas e retardar a progressão da doença.
Enxaqueca. O estudo de Di Lorenzo et al. (2019) investigou o papel das dietas cetogênicas no manejo da enxaqueca. Eles examinaram os mecanismos pelos quais as dietas cetogênicas podem exercer efeitos terapêuticos na enxaqueca, com base em evidências de ensaios clínicos e estudos experimentais. Descobertas sugerem que a cetogênese pode modular a neurotransmissão e reduzir a neuroinflamação no sistema nervoso central, contribuindo para a
redução da frequência e gravidade das crises de enxaqueca.
Mecanismos de ação das dietas cetogênicas
Os mecanismos de eficácia terapêutica das dietas cetogênicas em distúrbios neurológicos são complexos e envolvem uma série de processos bioquímicos que ocorrem no organismo em resposta à restrição de carboidratos e ao aumento da ingestão de gorduras. Vamos explorar mais detalhadamente esses mecanismos:
- Produção de corpos cetônicos. Quando uma pessoa segue uma dieta cetogênica, como vimos caracterizada por uma ingestão muito baixa de carboidratos e alta em gorduras, o corpo entra em estado de cetose. Nesse estado, o fígado metaboliza ácidos graxos e produz corpos cetônicos, como o β-hidroxibutirato, acetona e acetoacetato. Esses corpos cetônicos são uma fonte alternativa de energia para o cérebro, substituindo a glicose como principal combustível. Isso é especialmente relevante em condições neurológicas em que há disfunção no metabolismo da glicose, como na epilepsia e Alzheimer.
- Redução da excitabilidade neuronal. Os corpos cetônicos podem influenciar a excitabilidade neuronal, reduzindo a hiperexcitabilidade que está presente em várias condições neurológicas, como epilepsia e enxaqueca. Essa redução na excitabilidade neuronal pode ajudar a prevenir a ocorrência de crises epilépticas e ataques de enxaqueca, contribuindo para a melhora dos sintomas.
- Modulação da neurotransmissão. Os corpos cetônicos também podem modular a neurotransmissão, afetando a atividade dos neurotransmissores no cérebro. Por exemplo, eles podem influenciar a liberação e a captação de neurotransmissores como a serotonina e o glutamato, que desempenham papéis importantes na regulação da dor, inflamação e outros processos neurológicos.
- Redução da neuroinflamação a nível central. A dieta cetogênica tem sido associada à redução da inflamação no sistema nervoso central, o que pode ser benéfico em condições neurológicas caracterizadas por processos inflamatórios, como é o caso das doenças neurodegenerativas. A diminuição da inflamação pode ajudar a proteger os neurônios e a melhorar a função cerebral.
Todos esses mecanismos combinados contribuem para os efeitos terapêuticos das dietas cetogênicas nos distúrbios neurológicos, fornecendo uma abordagem metabólica alternativa que pode ajudar a modular a função cerebral, reduzir a ocorrência de crises e melhorar a qualidade de vida dos pacientes afetados por essas condições.
Efeitos adversos e como geri-los
Apesar dos potenciais benefícios terapêuticos, as terapias cetogênicas em adultos podem estar associadas a alguns efeitos adversos. Entre os efeitos adversos e/ou indesejados mais comuns discutidos no estudo estão a perda de peso, distúrbios gastrointestinais e alterações temporárias nos níveis de lipídios sanguíneos.
A perda de peso pode ser um efeito desejado para alguns pacientes, porém, para aqueles que precisam manter ou ganhar peso, é importante monitorar a ingestão calórica e ajustar a dieta adequadamente com um nutricionista habilitado.
Orientações para minimizar os efeitos colaterais. Os distúrbios gastrointestinais, como constipação, diarreia e náuseas, são frequentemente relatados em adultos em dietas cetogênicas. Estratégias como a ingestão de refeições menores ao longo do dia, aumento da ingestão de fibras e líquidos, e a introdução gradual de triglicerídeos de cadeia média (TCM) podem ajudar a minimizar esses efeitos colaterais. Além disso, a orientação de um nutricionista é fundamental para lidar com esses efeitos adversos e garantir a segurança e eficácia do tratamento.
Monitoramento e ajuste da dieta. Outro efeito adverso discutido é o aumento temporário nos níveis de lipídios sanguíneos, que pode ocorrer em resposta ao aumento do consumo de gorduras na dieta cetogênica. Embora esse aumento geralmente seja transitório e não cause danos significativos, é importante monitorar regularmente os níveis de lipídios e ajustar a dieta conforme necessário para minimizar esse efeito adverso.
Conclusão e considerações finais
Em resumo, as dietas cetogênicas têm demonstrado ser uma opção terapêutica eficaz para o manejo de diversas desordens neurológicas em adultos, atuando por meio de mecanismos como a produção de corpos cetônicos e a modulação do metabolismo energético. Apesar dos potenciais benefícios, é essencial estar ciente dos possíveis efeitos adversos associados a essas terapias e contar com o acompanhamento de profissionais de saúde especializados para garantir a segurança e eficácia do tratamento.
Referências e Leitura Complementar:
- McDonald, T. J., & Cervenka, M. C. (2018). Ketogenic diets for adult neurological disorders. Neurotherapeutics, 15, 1018-1031. ➞ Ler Artigo
- Selter, M., & Turner, R. S. (2019). Ketogenic diet as an adjunctive therapy in Alzheimer’s disease: Literature review and future directions. Journal of Neurology, Neurosurgery & Psychiatry, 90(10), 1041-1047. ➞ Ler Artigo
- Di Lorenzo, C., Coppola, G., Sirianni, G., Pierelli, F., & Parisi, P. (2019). Ketogenic diet in migraine: rationale, findings and perspectives. Neurological Sciences, 40(1), 1-4. ➞ Ler Artigo