A tomada de decisão relacionada à incorporação gradual de um hábito saudável, como levantar mais cedo para praticar exercícios físicos ou rejeitar momentaneamente uma refeição rica em gorduras saturadas, condimentos e açúcar, é uma construção diária apenas possível se o cérebro que decide for neurobiologicamente capaz de sustentar tais decisões. O que isso quer dizer? Leia o artigo e assista ao vídeo curto explicativo a seguir.
Antes de prosseguir com algumas reflexões interessantes sobre o assunto, deixo alguns questionamentos para direcionar o nosso bate-papo. Existe uma área específica do cérebro responsável pela rejeição ao fast-food? Uma outra responsável pela detecção e esquiva de más companhias? Será que a parte do nosso cérebro que decide colocar o despertador para tocar mais cedo é a mesma que decide sair de casa no final da tarde para ir à academia? Será que nossas decisões são compartimentalizadas dentro do cérebro ou seguem todas por uma via comum?
Primeiramente, que hábitos são esses?
O cérebro é um órgão complexo que desempenha um papel fundamental em nossa vida cotidiana. A principal maneira de manter o cérebro saudável e funcionando de forma otimizada é através da adoção de hábitos saudáveis. Exploraremos nesta sessão um pouco da relação entre os principais hábitos saudáveis e sua repercussão na estrutura cerebral, sobretudo o papel do exercício físico, da alimentação equilibrada, do sono reparador e da socialização.
Exercício físico. A prática regular de exercícios físicos tem sido associada a uma melhor saúde cerebral. Ele estimula a liberação de substâncias químicas no cérebro, como endorfinas e serotonina, diretamente relacionadas ao bem-estar e saúde mental. Além disso, o exercício físico promove o aumento do fluxo sanguíneo cerebrovascular, o que pode melhorar a função cognitiva e retardar o envelhecimento cerebral. Em termos de estrutura cerebral, o exercício físico regular tem sido associado ao aumento do volume de substância cinzenta em áreas relacionadas à memória, aprendizado e controle motor.
Alimentação equilibrada. Ela desempenha um papel crucial na saúde cerebral. Nutrientes essenciais presentes em alimentos como frutas, legumes, grãos integrais e fontes magras de proteína são fundamentais para o funcionamento adequado do cérebro. Estudos têm mostrado que dietas ricas em antioxidantes, vitaminas B, ômega-3 e polifenóis podem ajudar a prevenir o declínio cognitivo e reduzir o risco de doenças neurodegenerativas, como a doença de Alzheimer. Além disso, uma alimentação equilibrada contribui para a manutenção de um peso saudável, o que está relacionado a um menor risco de doenças cardiovasculares e diabetes, que por sua vez têm impactos negativos na anatomia cerebral. Ou seja, uma alimentação equilibrada fornece os ingredientes da própria estrutura cerebral, além de protegê-la ao longo do tempo.
Sono reparador. Como o próprio nome diz, o sono fisiológico é reparador para a estrutura cerebral. Durante ele, o cérebro realiza importantes processos de limpeza, removendo substâncias tóxicas acumuladas ao longo do dia. A privação do sono ou a sua má qualidade têm sido associadas a uma série de problemas de saúde, incluindo déficits cognitivos, maior risco de depressão e ansiedade, e um aumento do risco de doenças neurodegenerativas. Estudos mostram que a falta de sono pode levar a alterações na estrutura do cérebro, como redução do volume de substância cinzenta em áreas importantes para a cognição. Portanto, é essencial adotar hábitos saudáveis de sono para conservar o cérebro.
Socialização. A interação social tem um impacto significativo na neuroplasticidade e, portanto, na estrutura cerebral. Pesquisas com animais têm revelado que o isolamento social crônico está associado a alterações negativas no cérebro, como diminuição do tamanho do hipocampo, região relacionada à memória e aprendizagem. Além disso, estudos com humanos já demonstraram que a falta de interação social está associada a um maior risco de desenvolvimento de doenças neurodegenerativas.
O primeiro contato com os hábitos saudáveis
Os sentidos são a porta de entrada para o conhecimento. Por meio da experiência sensorial, as pessoas são capazes de processar informações e construir significado. O primeiro contato com um hábito saudável provavelmente será porque alguém lhe falou dele, você leu sobre em um site, ou viu alguém próximo praticá-lo. E mesmo nos primeiros momentos praticando esse novo hábito, o envolvimento dos sentidos estará presente tentando assimilar o novo aprendizado, transportando ele da memória de trabalho para os arquivos de longo prazo, eventualmente tornando esse conhecimento implícito.
Todos os hábitos e comportamentos saudáveis se valem da mesma estrutura neurossensorial quando somos apresentados a eles. Por que não assumir então que a porta de entrada das boas memórias para o cérebro é sempre a mesma (tato, paladar, visão, olfato, audição… e até a sensibilidade interoceptiva), podendo uma atividade estimular a via e beneficiar a outra por conta disso? Ter literalmente aberto o caminho, pavimentado essa via anteriormente?
Uma estrutura neural compartilhada
Continuando a nossa discussão anterior, uma vez que os hábitos foram apreendidos pelo nosso sistema sensorial, eles irão serão processados e armazenados em nosso cérebro. Aqui também podemos assumir, por conta de várias evidências, que essas áreas são relativamente comuns no cérebro, independentemente da qualidade do hábito. Em outras palavras, aprender qualquer coisa nova provavelmente vai envolver estruturas como o hipocampo, o córtex pré-frontal e o estriado. Decisões bem pensadas passarão pelo crivo analítico do córtex pré-frontal dorsolateral, assim como a repetição do bom comportamento será constantemente monitorada pelo sistema de recompensa, especificamente pela ação da dopamina nos núcleos sensíveis a ele, sendo o principal o núcleo accumbens. A construção de uma rotina implícita estará a cargo principalmente do estriado dorsolateral.
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