Uma convulsão é um evento que desperta atenção. Ver uma pessoa desconhecida ou, principalmente, um amigo ou familiar se debatendo no chão gera sentimentos diversos, como pânico, desconforto e dúvida. O que fazer? O que não fazer? O que pode vir a acontecer se deixarmos de tomar as medidas iniciais adequadas?
Antes de mais nada, é importante definir que uma crise convulsiva constitui-se um evento único, caracterizado por abalos motores involuntários, relacionados a descargas elétricas cerebrais anormais. A convulsão é só um tipo de crise epiléptica, relacionada a fenômenos motores e, possivelmente, a perda de consciência. Pode fazer parte de uma síndrome epiléptica, quando ocorre mais de uma vez em intervalos determinados, ou pode significar apenas um episódio isolado, sem recorrência.
Em casa, no trabalho, na rua ou saltando de paraquedas. Qualquer ambiente pode ser o cenário para uma situação do tipo. Recentemente, um homem epiléptico em uso regular de medicação (segundo laudo médico, apto e epilepsia controlada), apresentou uma crise convulsiva logo que saltou do avião. Era praticante de paraquedismo. Sua sorte foi a presença e calma do instrutor que, apesar de nunca ter se deparado com uma situação semelhante, conseguiu se aproximar do aluno e disparar o dispositivo em queda livre. O homem retomou a consciência a tempo. O pior não aconteceu.
Não é o caso da maioria das pessoas viver uma experiência tão inusitada, mas todo mundo está sujeito a se deparar com alguém tendo uma crise convulsiva. Para tanto, diversos especialistas recomendam medidas simples. Na verdade, o leigo deve se atentar muito mais ao que não fazer, do que propriamente intervir com medidas objetivas. Um exemplo clássico é não colocar a mão dentro da boca para proteger a língua durante a crise. Casos de amputação dos dedos já até foram descritos.
Nesse sentido, a gravura a seguir resume algumas recomendações:
#ParaTodos
IMAGEM 01
O atendimento da crise convulsiva em 12 passos
#ParaProfissionais
Mas, e depois, na unidade de saúde, o que deve ser feito? Já na emergência, em conjunto com uma equipe de saúde preparada, o médico deve se guiar por um processo diagnóstico estruturado. Uma crise epiléptica requer alguns cuidados e uma investigação detalhada para que se possa definir o melhor tratamento para cada caso. Tomando como base o livro ‘Emergências Clínicas Baseadas em Evidências’, redigido pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, listamos 12 passos fundamentais a serem seguidos pelo profissional que se depara com um evento do tipo:
1. Estabilização clínica, conforme preconizado pelos protocolos de suporte básico e avançado de vida;
- Exame clínico geral, incluindo parâmetros hemodinâmicos, temperatura, glicemia capilar, saturação de oxigênio;
- Exame neurológico, com ênfase na pesquisa da rigidez de nuca e fundo de olho;
- Investigar o uso de medicamentos, drogas ilícitas e abstinência (principalmente os sedativos hipnóticos, depressores do sistema nervoso central e álcool etílico);
- Averiguar história de lesão neurológica prévia ou epilepsia;
- Em pacientes epilépticos, obtenção de dados sobre medicações que faz uso e eventual não-aderência ao tratamento;
- Realização de exames laboratoriais para afastar os principais distúrbios hidroeletrolíticos relacionados a crises: glicemia, ureia, creatinina, sódio, cálcio, fósforo, magnésio, hemograma e gasometria arterial;
- Dosagem sérica de drogas antiepilépticas, útil em pacientes previamente epilépticos;
- Eletrocardiograma (para afastar arritmias e síndrome do QT longo);
- Exame de imagem do crânio (ressonância magnética ou tomografia computadorizada, dependendo da disponibilidade, urgência e capacidade de cooperação do paciente). Nos pacientes epilépticos com etiologia já investigada pode-se, criteriosamente, prescindir de novo exame de imagem. A tomografia pode ainda ser necessária para excluir lesões secundárias à crise, como traumatismo craniano;
11. Exame do líquido cefalorraquidiano, fundamental nos casos de suspeita de meningite ou encefalite;
- Investigação de foco infeccioso sistêmico, em casos selecionados.
E em relação às medicações?
Vale ressaltar que o objetivo das drogas antiepilépticas é cessar uma crise prolongada e prevenir novas crises. Seu uso é criterioso e reservado para casos selecionados, tendo em vista que a maioria das crises é autolimitada.
Fonte: Livro Emergências Clínicas Baseadas em Evidências, USP.
IMAGEM 01: CETAPH; Centro de Treinamento em Atendimento Pré-Hospitalar.