Estresse. Não dá nem para contar nos dedos de ambas as mãos quantas vezes ouvimos essa palavra em um mês. O estresse (ou, mais adequadamente, o excesso dele) se tornou praticamente uma epidemia, estando entre um dos principais e mais conhecidos vilões para a saúde.
Não é por menos. Afinal, uma das características mais marcantes dos últimos dois séculos é o ritmo de vida cada vez mais acelerado.
Trabalho, contas, boletos, barulho, falta de sono, alimentação inadequada, problemas de saúde… Quase tudo hoje contribui para que estejamos cada vez mais estressados.
O estresse, na verdade, é uma resposta natural a situações de ameaça. Tanto que nosso corpo evoluiu com um sistema neurológico e hormonal (envolvendo hormônios como adrenalina e cortisol) justamente para isso.
Esse sistema aumenta a pressão arterial e frequência cardíaca, além de aumentar o desempenho muscular e cerebral para que possamos responder adequadamente a essa ameaça.
Porém, no mundo natural, estaríamos expostos a ameaças em apenas alguns momentos do dia. Hoje, ao contrário, vivemos sob a constante sensação de ameaça gerada pelo excesso de informação que recebemos todos os dias. Daí surge o estresse.
Várias pesquisas têm mostrado como o estresse é fator de risco para várias doenças cardiovasculares, psiquiátricas e até cânceres. Porém, faltava um elo na cadeia firmar um mecanismo para tudo isso.
Afinal, além de estresse, temos hábitos de vida nocivos, ambientes urbanos com poluição de todos os tipos… Será que o estresse por si só pode realmente nos adoecer?
Para tirar essa dúvida, vamos começar com uma pergunta: você já ouviu falar de telômeros?
Protetores genéticos
Os telômeros são estruturas presentes nas extremidades dos cromossomos e também são formados por ácidos nucléicos (fazem parte do material genético).
Sua função principal é servir de escudo para os cromossomos contra possíveis danos que, por sua vez, podem afetar a expressão dos genes e gerar vários problemas de saúde.
Basicamente, eles é que sofrem o dano ao invés do restante do material genético e, depois, são regenerados pela enzima telomerase para, então, repetir o processo.
Telômeros, adoecimento, estresse e envelhecimento
O que faz dos telômeros a estrela nesse assunto é que uma das características mais marcantes do envelhecimento é o encurtamento telomérico.
Ao longo dos anos, vamos perdendo a capacidade de regenerar os telômeros e, por consequência, eles vão se tornando cada vez mais curtos.
Quanto mais curtos, menos os telômeros conseguem defender os cromossomos contra danos estruturais. Sua função vai degenerando ao longo do tempo e, assim, ocorre o envelhecimento do corpo.
Até aí, é tudo um processo natural. Porém, sabemos que é possível envelhecer com saúde. Então, o que explicaria o adoecimento?
É claro que telômeros não são tudo. Sedentarismo e dieta inadequada levam a obesidade, hipertensão, diabetes, formação de placas de aterosclerose e, por fim, resultam em infartos do miocárdio e acidentes vasculares encefálicos (AVE), por exemplo.
Porém, conforme pesquisas divulgadas pela American Heart Association, encurtamento telomérico está também associado a hipertensão, diabetes, risco de AVE e infarto do miocárdio. Isso sem contar o risco de câncer, cuja base são os dados ao material genético.
Presume-se que telômeros mais curtos, ao favorecerem envelhecimento celular, levam ao surgimento dessas doenças, da mesma forma que elas próprias também causam o encurtamento telomérico. Ou seja: um ciclo vicioso que explicaria por que quanto mais comorbidades temos, mais rapidamente aparentamos envelhecer. E que também explicaria porque é mais fácil desenvolver comorbidades conforme a idade avança.
O estresse entra em cena
E onde o estresse psicológico entra nisso tudo?
Bom, estudar telômeros e estresse não é uma tarefa fácil. Ainda existem poucas pesquisas no assunto e a maioria tem poucos participantes, além de não serem no formato que gera as evidências mais sólidas.
Mesmo assim, encontramos meta-análises (a forma mais forte de evidência na Medicina Baseada em Evidências) que demonstram: estresse realmente leva ao encurtamento dos telômeros.
As pesquisas mostram que altos níveis de “estresse percebido” (ou seja, o quanto o indivíduo relata se sentir estressado) estão associados a telômeros mais curtos. Além disso, pessoas mais estressadas também têm uma atividade reduzida da telomerase, com menor capacidade de regeneração telomérica.
Outra evidência compatível é a de que pessoas com Depressão também têm telômeros mais curtos, o que coincide com seu risco aumentado para vários problemas de saúde física e psicológica.
Conclusão
Juntando as peças do quebra-cabeças, fica fácil concluir o que todos esperávamos. Realmente, estresse emocional é capaz de envelhecer e, mais que isso, causar doenças de todos os tipos. Estresse e envelhecimento, aliás, andam lado a lado.
Se você conhece uma pessoa idosa que parece mais saudável que você, pergunte como ela chegou lá.
Provavelmente, além de uma dieta adequada e atividades físicas e mentais até idades avançadas, ela praticou a capacidade de manejar estresse e de viver com mais tranquilidade.
Não é de assustar, então, que medidas para controle de estresse como a meditação Mindfulness sejam capazes de aumentar a produção de telomerase.
Assim, fazer terapia e aprender a viver com mais tranquilidade pode proteger seus telômeros, retardar o envelhecimento e reduzir o adoecimento “da idade”.
Nada melhor para os nervos e para a pele (e, aparentemente, para os genes) que uma boa dose de paz e tranquilidade.
Referências:
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2. SCHUTTE, Nicola S.; MALOUFF, John M.. The Relationship Between Perceived Stress and Telomere Length: A Meta-analysis. Stress And Health, [s.l.], v. 32, n. 4, p.313-319, 13 nov. 2014. Wiley. http://dx.doi.org/10.1002/smi.2607.
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5. SCHUTTE, Nicola S.; MALOUFF, John M.. A meta-analytic review of the effects of mindfulness meditation on telomerase activity. Psychoneuroendocrinology, [s.l.], v. 42, p.45-48, abr. 2014. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.psyneuen.2013.12.017.